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Projeto Mãos que Reconstroem fomenta o trabalho prisional para mais de 15 mil apenados no RS

Para uma ressocialização efetiva, iniciativa busca estimular a aquisição de conhecimento e de novas habilidades por apenados

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imagens do trabalho no Complexo Prisional de Canoas.
Iniciativa oportuniza qualificação profissional e remição de pena a mais de 15 mil pessoas privadas de liberdade no Estado - Foto: Mariana Kussler/Ascom SSPS

O trabalho realizado dentro de unidades prisionais é um dos principais pilares do governo do Estado no processo de ressocialização da população privada de liberdade. Com o objetivo de alavancá-lo, o Estado, por meio da Secretaria de Sistemas Penal e Socioeducativo (SSPS) e de sua vinculada, a Polícia Penal, implantou em 2025 o projeto Mãos que Reconstroem, com a prerrogativa de fomentar a mão de obra prisional, oportunizando qualificação profissional, ocupação produtiva e remição de pena a mais de 15 mil pessoas privadas de liberdade no Rio Grande do Sul. Nessa parcela, há, ainda, os que possuem carteira assinada, estão vinculados a termos de cooperação ou que atuam de forma autônoma, gerando renda.  

O número de pessoas privadas de liberdade que exercem atividades laborais no sistema prisional gaúcho registrou crescimento expressivo em 2025. Dados da SSP indicam que, em janeiro, 13.517 apenados dos regimes aberto, semiaberto e fechado estavam inseridos em algum tipo de trabalho. O aumento para mais de 15 mil - superior a 10% -, evidencia o avanço das políticas de ressocialização no Estado.

Atualmente, todos os 114 estabelecimentos prisionais do Rio Grande do Sul contam com apenados trabalhando. As frentes dentro das unidades são diversificadas, abrangendo desde serviços de manutenção e apoio interno até a produção artesanal, que reúne cerca de 10 mil participantes. Além disso, mais de três mil presos atuam em atividades externas, seja de forma autônoma ou com vínculo formal de emprego, reforçando o papel do trabalho como instrumento de reintegração social e dignidade no cumprimento da pena.

Os trabalhos com vínculo formal são desenvolvidos por meio de 120 termos de cooperação, contemplando setores como o têxtil, o de produção de bolsas e calçados, o de lavanderia, o alimentício e o de estofados, entre outros.

Imagens do trabalho no Complexo Prisional de Canoas
"Nosso investimento não é só no agora, mas num futuro com mais segurança e redução dos índices de criminalidade", diz secretário - Foto: Rafa Marin/Ascom Polícia Penal

Setor têxtil é um dos destaques da utilização de mão de obra prisional no RS

No regime fechado, uma das áreas com maior destaque é a têxtil, com cerca de 400 apenados - o número varia de acordo com a entrada e a saída do sistema - atuando em nove unidades penitenciárias por meio de 12 termos de cooperação. Outros cinco estão em fase de implantação, sendo o mais expressivo voltado ao segmento de atacado fashion.

Ao estimular a aquisição de conhecimento e de novas habilidades, a proposta é que apenados e apenadas rompam o vínculo com a criminalidade e, ao deixarem a privação de liberdade, conquistem independência e autonomia para transformar suas vidas e as de suas famílias. 

“Um dia, essas pessoas presas vão sair e para que se mantenham fora do crime precisam de um novo horizonte. Entre os fatores que dificultam a reinserção na sociedade, segundo estudos já realizados em nível nacional, estão a falta de educação e de qualificação profissional. Por isso, nosso investimento não é só para o agora, mas para um futuro com mais segurança, com redução dos índices de criminalidade nos municípios e no Estado”, ressalta o titular da SSPS, Jorge Pozzobom.

O trabalho prisional por termos de cooperação com empresas

Os termos de cooperação têm validade definida e só entram em vigor após a SSPS confirmar que a empresa cumpre todos os requisitos exigidos. Além de permitir a contratação de mão de obra prisional e oferecer orientação profissional às pessoas privadas de liberdade, os convênios entre Estado, via Polícia Penal, e empresas, asseguram que todo o processo ocorra conforme os direitos e garantias previstos na Lei de Execução Penal (LEP). 

Os apenados têm direito à remição - a cada três dias trabalhados, é reduzido um da pena -, além de receber, no mínimo, 75% do salário-mínimo vigente, por uma jornada de trabalho de seis a oito horas diárias, de segunda a sexta-feira. O valor é depositado em uma conta bancária e os saques ocorrem de duas maneiras: ao deixar a penitenciária, como uma espécie  de poupança para recomeçar a vida, ou por meio de saques mensais autorizados a familiares.

Entre os benefícios para a empresa estão economia significativa em comparação à contratação via Consolidação das Leis do Trabalho CLT - sem encargos como férias, 13º salário e tributos trabalhistas-, além de uma produtividade média 20% superior e isenção de despesas com relação à utilização do espaço físico no estabelecimento prisional, como aluguel, água e energia elétrica.

imagens do trabalho no Complexo Prisional de Canoas
Atualmente, todos os 114 estabelecimentos prisionais do Rio Grande do Sul contam com apenados trabalhando - Foto: Rafa Marin/Ascom Polícia Penal

Produção de capas impermeáveis no Complexo Prisional de Canoas (CPC)

No CPC, dos 154 detentos que trabalham de forma remunerada por meio de termos de cooperação com oito empresas, 95 estão ligados à indústria têxtil. 

Para a Pioneira Capas, indústria que confecciona vestes impermeáveis para o mercado nacional e, também, da América Latina, 43 pessoas privadas de liberdade produzem, diariamente, 400 conjuntos da linha de segurança e motociclista, feitos em nylon. 

O apenado Mário* celebra o fato de ter aprendido um novo ofício e de poder ajudar a esposa e as filhas financeiramente. “Uma certeza que tenho é que o trabalho mudou minha forma de ver a prisão. É maravilhosa a experiência de poder trabalhar aqui dentro, poder sair da cela e fazer algo produtivo”, afirma.

A empresa iniciou suas atividades no Complexo, em 2021, com 12 apenados. Desde então, mais que triplicou a utilização de mão de obra, acompanhada pelo crescimento da produção. Até dezembro de 2024, foram confeccionados 163 mil conjuntos. Somente em 2025, já são 80 mil unidades adicionais, totalizando mais de 243 mil peças desde o início da operação.

Segundo o sócio-diretor de Operações da Pioneira Capas, Fabio Marques Pereira, a produção cresce sem se descuidar dos detalhes. “Como a operação é própria, conseguimos garantir uma qualidade maior do que em ateliês descentralizados, com mais de 94% das peças aprovadas já na primeira checagem. Nesse sentido, mantemos um bom equilíbrio. Temos previsibilidade e, mesmo que a eficiência não seja a mais alta possível, o resultado final compensa pelo nível de qualidade e controle que conseguimos manter”, observa.

A parceria, conforme Pereira, é extremamente benéfica tanto do ponto de vista operacional quanto social. “Há procura ativa de vagas por apenados, o que nos motiva a buscar possibilidades de ampliar o espaço físico da operação. Igualmente, já tivemos casos positivos de reintegração pós-cumprimento de pena”, destaca.

No Complexo há, ainda, detentos vinculados a outras duas empresas têxteis: uma de capas impermeáveis profissionais e outra de produção de enxoval hospitalar e peças de vestuário para o Exército.

Superintendente da Polícia Penal, Sergio Dalcol, diz que o incentivo é fundamental para viabilizar novas perspectivas de vida aos apenados. "Acreditamos na reintegração social como um direito e uma responsabilidade coletiva. Por isso, promovemos ações que oferecem qualificação profissional e trabalho dentro do sistema prisional, reconhecendo o potencial de transformação de cada pessoa. Reafirmamos, assim, que todos têm valor, podem fazer escolhas diferentes e reconstruir suas trajetórias com dignidade", enfatiza.

imagens do trabalho no Complexo Prisional de Canoas, Empresa Inclusão produz uniformes Exército
Em Canoas, detentos produzem capas impermeáveis profissionais, enxoval hospitalar e peças de vestuário para o Exército - Foto: Mariana Kussler/Ascom SSPS

Linha profissional de uniformes é produzida em três penitenciárias do RS 

Ainda em Canoas, mas na Penitenciária Estadual (Pecan I), a empresa Cenci utiliza mão de obra prisional para a confecção de uniformes profissionais. São produzidas 9 mil peças mensais de calças, camisas, jaquetas, camisetas, moletons, camisetas gola polo, macacões e jalecos que envolvem a participação de pelo menos 75 apenados. A Cenci possui outras linhas de confecção, nas penitenciárias estaduais de Bento Gonçalves e Sapucaia do Sul. Nas três unidades, o volume médio mensal chega a 15 mil peças.

Gerson*, de 36 anos, já tinha noção de costura quando começou na confecção de uniformes para a Cenci. “Aprendi muito com a minha mãe, que a vida toda trabalhou com costura. Hoje, todo valor que recebo vai para ela e, também, para a compra de máquinas para eu montar minha própria confecção”, conta.

Já Carlos*, de 27 anos, não possuía nenhuma experiência em costura. “Fui aprendendo aos poucos, no dia a dia, com a senhora da empresa que nos orienta aqui. O trabalho é uma experiência que mudou minha forma de encarar a prisão. Antes, só ficava na cela e trabalhar tem sido uma terapia, uma experiência que faz amadurecer os pensamentos.”

A parceria da Cenci com o governo já dura oito anos, e a boa qualidade dos serviços prestados pelos custodiados, segundo a gerente industrial da Cenci Uniformes, Laura Pandini, é um dos fatores que motivam a empresa a manter e ampliar a produção com mão de obra prisional. “Temos, inclusive, algumas células nas linhas de confecção tão bem desenvolvidas que podemos confiar a produção de pedidos mais detalhados e com maior critério de qualidade”, ressalta.

Sobre egressos do sistema, Laura conta que, atualmente, há um profissional trabalhando na matriz da empresa em Bento Gonçalves, mas que já teve outros. “Há, inclusive, um caso de um ex-detento que abriu sua própria confecção e fez da experiência que teve conosco seu novo ofício.” 

Atualmente, duas novas linhas de produção da empresa estão em fase de instalação em unidades prisionais, uma no CPC e outra na Penitenciária Estadual de Arroio dos Ratos.

Imagens do trabalho prisional na Pecan
No regime fechado, uma das áreas com maior destaque é a têxtil, com cerca de 400 apenados trabalhando - Foto: Rodrigo Borba/Ascom Polícia Penal

Outras linhas de produção têxtil em unidades prisionais

No Presídio Estadual de Iraí, a produção é voltada à confecção de vestuário feminino. Em Montenegro e Osório, as penitenciárias moduladas possuem linha de produção de vestuários para o Exército e de lingeries, respectivamente. No Presídio Regional de Santo Ângelo, detentos confeccionam enfeites para pets e, no de Santa Cruz do Sul, produzem roupas impermeáveis para motoqueiros. Já na Penitenciária de Charqueadas II e III, presos confeccionam peças de vestuário e kimonos esportivos.

Importância do incentivo ao trabalho prisional

O trabalho, considerado um dos pilares do tratamento penal, integra um conjunto de ações promovidas pelo Estado no sistema prisional com o objetivo de prevenir a reincidência criminal e facilitar a reintegração social dos apenados. A legislação define que, na atribuição laboral, sejam levadas em conta a habilitação, a condição pessoal e as necessidades futuras do apenado, além das oportunidades oferecidas pelo mercado. 

Nessa parceria entre Estado e setor privado, o ganho é duplo: de um lado promove a ressocialização e a reinserção da pessoa privada de liberdade; de outro, contribui para a qualificação da mão de obra em um segmento da economia com escassez de profissionais capacitados. Dessa forma, o apenado, ao se tornar egresso do sistema prisional, passa a ter condições reais de ingressar no mercado de trabalho.

Nesse sentido, o Programa Mãos que Reconstroem tem se consolidado como um importante estimulador de novas parcerias. Em setembro de 2025, dos 15.948 apenados trabalhando, 2.683 recebiam até 75% do salário-mínimo via termos de cooperação - sendo 1.217 no regime fechado e 1.236 no semiaberto. Esse número representa mais que o dobro em comparação com 2019, quando 1.191 pessoas privadas de liberdade eram remuneradas.


*nomes fictícios para preservar a identidade dos apenados


Texto: Paula Sória Quedi/Ascom SSPS
Edição: Secom

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