Governos do Sul apostam em fundo regional para financiar infraestrutura
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A mesa de debates que inaugurou o Fórum Desenvolvimento, Inovação e Integração Regional, promovido pelo jornal espanhol El País, nesta sexta-feira (6), em Porto Alegre, deixou como principal mensagem a necessidade da criação de um fundo federal destinado a financiar investimentos em infraestrutura na região sul do Brasil e no Mato Grosso do Sul.
Coube ao governador Tarso Genro fazer a abertura dos trabalhos e sugerir o debate do tema. "Esse fundo deve financiar decisões compartilhadas para que a regulação seja produzida a partir da concertação, caso contrário, surge a crise e a reversão da integração", afirmou.
A instituição da Superintendência de Desenvolvimento do Sul (Sudesul), cujo objetivo seria o de planejar e gerir exclusivamente projetos de infraestrutura de Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, e a de um fundo para financiar a execução dessas obras, foi encaminhada em 2013 ao Governo Federal. A proposta foi elaborada pelo Conselho de Desenvolvimento e Integração Sul (Codesul) do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE).
Segundo o secretário de Planejamento do Paraná, Cassio Taniguchi, a presidente Dilma Rousseff foi receptiva à ideia. "Dilma reconhece a importância desse mecanismo, à exemplo dos que existem no Nordeste ou na Amazônia", comparou.
A diferença entre o que seria a Sudesul e o formato, por exemplo, da Sudene (Nordeste) ou da Suderco (Centro-Oeste), é que o organismo sulino deverá ser um consórcio entre os três Estados do sul e a União. "Terá uma estrutura enxuta, gerida pelo próprio BRDE", explicou o diretor de Planejamento do banco, Carlos Henrique Horn.
O secretário do Planejamento de Santa Catarina, Murilo Xavier Flores, reforçou o pedido pra que a demanda dos estados do Sul seja atendida. "Estamos apostando no Codesul. Essa iniciativa é muito importante, pois apesar de exibirmos índices melhores que outras regiões brasileiras, certamente a sociedade espera mais".
Tarso defende integração com diálogo
O tema proposto aos palestrantes - desenvolvimento regional, financiamento e infraestrutura - permitiu que cada convidado abordasse um aspecto distinto da questão.
O primeiro a falar foi o governador Tarso Genro. Em sintonia com a apresentação elogiosa do jornalista e diretor editorial do Grupo Prisa de Comunicação - organizador do evento - Javier Moreno, que o classificou como "um dos poucos políticos que oferece qualidade em sua reflexão e que une política, pensamento e ação", o chefe do Executivo gaúcho preferiu questionar sob o ponto de vista teórico o assunto proposto.
Aproveitando que o fórum é uma promoção do jornal espanhol El País, que desde novembro mantém uma edição em português na internet, Tarso usou o exemplo europeu para defender que a integração seja feita com base no diálogo entre todos os envolvidos.
"Na Europa foi feita um integração não concertária, cujas regras foram dadas pelos países mais fortes que só depois chamaram as nações de economia mais frágil para ingressarem. Não houve um mecanismo que previsse a integração de maneira segura para os mais atrasados", lembrou.
A crítica do chefe do Executivo do Rio Grande do Sul à falta de solidariedade entre nações da União Europeia também se aplica ao excesso de protecionismo nas relações regionais brasileiras e latino-americanas. "No auge da globalização, qualquer integração era feita com a preocupação de como proteger a economia local", pontuou.
Esse mecanismo, na opinião do governador, é ineficaz, na medida em que provoca a "acomodação competitiva" das economias. Por outro lado, permitir que empresas multinacionais se instalem em uma região sem promover nenhuma regulação, "estabelecendo contratos com cláusulas de compras locais, que estimulem as cadeias produtivas", é uma irresponsabilidade dos governantes.
Para Tarso, a integração moderna deve ser construída sobre os conceitos da cooperação e de transferência de tecnologia, que impulsionem a base produtiva local pré-existente e atendam aos interesses das empresas recém chegadas. "Estimular a potência associativa pode converter uma relação irracional e altamente especulativa em uma relação virtuosa".
De acordo com o governador gaúcho, o capital financeiro ainda exerce pressão sobre os Estados, obrigando-os a disputar investimentos a partir de renúncias fiscais que nem sempre dão resultado, pois desconsideram a economia local. E a melhor forma de se contrapor à essa força é exercitando a política, através do diálogo e da concertação. "Não basta ser contra ou a favor da globalização, porque já se concretizou. É preciso saber como se relacionar com ela, transformar a relação de dependência e subordinação em interdependência e colaboração", observou.
Representantes de Santa Catarina e Paraná lembram fragilidades
Os dois conferencistas que falaram na sequência aproveitaram as deixas de Tarso para construírem seus discursos, que foram, entretanto, mais centrados na discussão de problemas práticos enfrentados na área de logística em seus Estados.
O secretário de Planejamento de Santa Catarina, Murilo Xavier Flores, lembrou que apesar do território diminuto, Santa Catarina é hoje detentor do sexto maior Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil. "Apesar de mantermos índices de desenvolvimento social e econômicos equilibrados, a deficiência na infraestrutura logística limita a expansão do nosso crescimento", lamentou, enumerando algumas fragilidades para o transporte da produção agrícola.
O tema que mais preocupa o gestor é o sistema ferroviário. "Precisamos urgente de uma ligação leste-oeste, pois corremos o risco de limitar a produção do interior do Estado", alertou, referindo-se à necessidade de escoar produtos para os portos regionais.
Já o secretário de Planejamento do Paraná, defendeu a ampliação da distribuição de gás natural como um estímulo fundamental para o desenvolvimento industrial. "Sabemos que o Rio Grande do Sul está desenvolvendo um projeto de um porto de regaseificação de GNL. Precisamos de um política consistente nessa área", apontou.
Melhorias em rodovias, portos e aeroportos também foram abordados nos debates, cuja conclusão foi a de que o transporte de mercadorias precisa diversificar os modais para ganhar em eficiência e reduzir custos. "Não podemos depender exclusivamente de estradas", apelou Flores.
Taniguchi encerrou sua fala quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou, arrebatando as atenções. Mas deixou a mensagem final: "que este fundo financie a nossa infraestrutura, que é o principal gargalo que temos".
Texto: Naira Hofmeister
Edição: Redação Secom (51) 3210.4305